Hipácia de Alexandria
Quem foi Hipácia, matemática, astrônoma e uma das mais importantes pensadoras da Antiguidade, morta por cristãos.
A cidade de Alexandria foi fundada por Alexandre,
o Grande, no ano de 332 a.C, e logo se tornou o principal porto do
norte do Egipto. A sua localização privilegiada, na encruzilhada das
rotas da Ásia, da África e da Europa, transformou a cidade num lugar
ideal para centralizar e concentrar a arte, a ciência e a filosofia do
Oriente e do Ocidente.
A Biblioteca de Alexandria
foi construída por Ptolomeu I no século IV a.C. Após a decadência de
Atenas como centro cultural, Alexandria tornou-se o grande pólo da
cultura helenística. Todo e qualquer manuscrito que entrava no país
(trazido por mercadores e filósofos de toda a parte do mundo [comprado
ou pedido de empréstimo]) era classificado em catálogo, copiado e
incorporado ao acervo da biblioteca. No século seguinte à sua criação, a
biblioteca já reunia entre 500 mil e 700 mil documentos. Além de ser
biblioteca, no actual sentido, foi também a primeira universidade, onde
se formaram grandes cientistas, como os gregos Euclides e Arquimedes.
Os eruditos encarregados da biblioteca
eram considerados os homens mais capazes de Alexandria. Zenódoto de
Éfeso foi o primeiro bibliotecário e o poeta Calímaco fez o primeiro
catálogo geral dos livros. Os bibliotecários mais notáveis foram
Aristófanes de Bizâncio (c. 257-180 a.C) e Aristarco da Samotrácia (c.
217-145 a.C).
Hipácia foi a última grande cientista de Alexandria.
Nasceu cerca de 370 d.C . Filha de Theon, um renomado filósofo,
astrónomo, matemático e autor de diversas obras, professor da
Universidade de Alexandria.Hipácia e Theon tiveram uma ligação muito
forte e este transmitiu-lhe seu próprio conhecimento e compartilhou de
sua paixão na busca de respostas sobre o desconhecido. Quando estava
ainda sob a tutela e orientação do seu pai, ingressou numa disciplinada
rotina física para assegurar um corpo saudável para uma mente altamente
funcional.
Hipácia estudou matemática e astronomia
na Academia de Alexandria. Devorava conhecimento: filosofia, matemática,
astronomia, religião, poesia e artes. Hipácia é um marco na História da
Matemática que poucos conhecem, tendo sido equiparada a Ptolomeu (85 –
165), Euclides (c. 330 a. C. – 260 a. C.), Apolônio (262 a. C. – 190 a.
C), Diofanto (século III a. C.) e Hiparco (190 a. C. – 125 a. C.).O seu
talento para ensinar geometria, astronomia, filosofia e matemática
atraía estudantes admiradores de todo o império romano.
Aos 30 anos tornou-se directora da
Academia de Alexandria. Do seu trabalho, infelizmente, pouco chegou até
nós. Alguns tratados foram destruídos com a Biblioteca, outros quando o
templo de Serápis foi saqueado. Grande parte do que sabemos sobre
Hipácia vem de correspondências suas e de historiadores seus
contemporâneos que dela falaram. Um notável filósofo, Sinesius de Cirene
(370 – 413), foi seu aluno e escrevia-lhe frequentemente pedindo-lhe
conselhos sobre o seu trabalho. Através destas cartas ficou-se a saber
que Hipácia inventou alguns instrumentos para a astronomia (astrolábio e
planisfério) e aparelhos usados na física, entre os quais um
higrómetro. Desenvolveu estudos sobre a Álgebra de Diofanto (“Sobre o
Canon Astronómico de Diofanto”), que escreveu um tratado sobre as
secções cónicas de Polónio (“Sobre as Cónicas de Polónio”) e alguns
comentários sobre os matemáticos clássicos, incluindo Ptolomeu. E em
colaboração com o seu pai, escreveu um tratado sobre Euclides.
Ficou famosa por ser uma grande solucionadora de problemas. Ela era
obcecada pela matemática e pelo processo de demonstração lógica.
A tragédia de Hipácia foi ter vivido
numa época de luta entre o paganismo e o cristianismo, com este último a
tentar apoderar-se dos centros importantes então existentes. Hipácia
era pagã, facto normal para alguém com os seus interesses, pois o saber
era relacionado com o chamado paganismo que dominou os séculos
anteriores e era alicerçado nas tradições de liberdade de pensamento.
O cristianismo foi oficializado em 390 d.C, e o recém nomeado chefe religioso de Alexandria, o bispo Cirilo, dispôs-se a destruir todos os pagãos assim como seus monumentos e escritos.
Por causa de suas idéias científicas
pagãs, como por exemplo a de que o Universo seria regido por leis
matemáticas, Hipácia foi considerada uma herética pelos chefes cristãos
da cidade. A admiração e protecção que o político romano Orestes dedicou
a Hipácia pouco adiantou, e acirrou ainda mais o ódio do bispo Cirilo
por ela e, quando este se tornou patriarca de Alexandria, iniciou uma
perseguição sistemática aos seguidores de Platão e colocou-a à encabeça
da lista.
Assim, numa tarde de 415 d.C, a ira dos
cristãos abateu-se sobre Hipácia. Quando regressava do Museu, foi
atacada em plena rua por uma turba de cristãos enfurecidos, incitados e
comandados por “São” Cirilo. Arrastada para dentro de uma igreja, foi
cruelmente torturada até a morte e ainda teve seu corpo esquartejado e
queimado.
O historiador Edward Gibbon escreve:
“Num dia fatal, na estação sagrada de Lent, Hipácia foi arrancada de
sua carruagem, teve suas roupas rasgadas e foi arrastada nua para a
igreja. Lá foi desumanamente massacrada pelas mãos de Pedro, o Leitor, e
sua horda de fanáticos selvagens. A carne foi esfolada de seus ossos
com ostras afiadas e seus membros, ainda palpitantes, foram atirados às
chamas”.
Pouco depois, a grande Biblioteca de
Alexandria seria destruída e muito pouco do que foi aquele grande centro
de saber sobreviveria até os dias de hoje.
Enrico Riboni descreve:
“a brilhante professora de matemática representava uma ameaça para a
difusão do cristianismo, pela sua defesa da Ciência e do Neoplatonismo. O
facto de ela ser mulher, muito bela e carismática, fazia a sua
existência ainda mais intolerável aos olhos dos cristãos. A sua morte
marcou uma reviravolta: após o seu assassinato, numerosos pesquisadores e
filósofos trocaram Alexandria pela Índia e pela Pérsia, e Alexandria
deixou de ser o grande centro de ensino das ciências do mundo antigo.
Além do mais, a Ciência retrocederá no Ocidente e não atingirá de novo
um nível comparável ao da Alexandria antiga senão no início da Revolução
Industrial. Os trabalhos da Escola de Alexandria sobre matemática,
física e astronomia serão preservados, em parte, pelos árabes, persas,
indianos e também chineses. O Ocidente, pelo seu lado, mergulhará no
obscurantismo da Idade Média, do qual começará a sair somente mais de um
mil anos depois. Em reconhecimento pelos seus méritos de perseguidor da comunidade científica e dos judeus de Alexandria, Cirilo será canonizado e promovido a Doutor da Igreja, em 1882.”
E Carl Sagan acrescenta:
“Há cerca de 2000 anos, emergiu uma civilização científica esplêndida
na nossa história, e sua base era em Alexandria. Apesar das grandes
condições de florescer, ela decaiu. Sua última cientista foi uma mulher,
considerada pagã. Seu nome era Hipácia. Com uma sociedade conservadora à
respeito do trabalho da mulher e do seu papel, com o aumento
progressivo do poder da Igreja, formadora de opiniões e conservadora
quanto à ciência, e devido à Alexandria estar sob domínio romano, após o
assassinato de Hipácia, em 415, essa biblioteca foi destruída. Milhares
dos preciosos documentos dessa biblioteca foram em grande parte
queimados e perdidos para sempre, e com ela todo o progresso científico e
filosófico da época.”
"Hipátia antes de ser morta na igreja", pintura de Charles William Mitchell, 1885.
A saga de HIPÁCIA foi resgatada em AGORA,
de Alejandro Amennabar.
O filme, estrelado por Rachel Weisz
Assisti este filme, chorei com tamanha crueldade.
Relembrei hoje, quando um amigo postou no face ...
Achei interessante compartilhar.
GIOVANA CRISTINA SCHNEIDER
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