Catarina vinha caminhando. Aquela manhã estava belíssima. Olhar os prados ainda com orvalhos, era uma linda poesia, pensava. A brisa fresca completava o cenário. De repente, o tempo mudou, uma ventania começou, Catarina caiu, e tudo escureceu.
Catarina abre os olhos devagar, bem devagarinho, pois sente a presença de alguém e fica apreensiva. Algo cutuca a sua nuca, ela sente que é uma coisa molhada e fria. Dá um grito e de um salto está de pé. Quando olha para ver o que era, dá de cara com um cavalo baio e um pequeno menino montado nele. Catarina olha para ele e pergunta:
— Que fazes aqui, e quem é você?
— Moça, eu estava passando aqui com o meu cavalo e vi que estava caída, me aproximei para saber o que estava acontecendo.
Ela está se limpando, visivelmente irritada. Responde:
— Não me respondestes…
— Calma, minha senhora, sempre cavalgo por aqui e pelas pradarias — o menino respondeu.
— Tudo bem menino, já que não tem nome — Catarina fala, agora menos irritada e até dá um sorriso.
— Bom, todos me chamam de negrinho, nunca tive outro nome — ele responde cabisbaixo.
— Tudo bem negrinho, vejo que estar a pastorear?
— Sim.
— E cadê os outros cavalos?
— Eles estão na estância. Agora somente o baio e eu cavalgamos por onde queremos. Até coloquei o nome dele de ventania.
— Que bom ter a liberdade de sair por aí a cavalgar — Catarina falou.
— Mas, nem sempre foi assim…
— Como assim?
— A senhora é daqui?
— Bom, não exatamente, nasci aqui, mas fui embora com minha mãe e meu pai quando ainda era um bebê. Estou de volta pois meu vô faleceu — Catarina respirou fundo.
— Sinto muito — o negrinho falou.
— Tudo bem, inclusive ele tem uma estância aqui perto. Até pensei que o cavalo fosse de lá. Mas vejo que me enganei.
— É, se enganou. Nós não temos paradeiro. Muitas vezes ajudamos quando somos solicitados. Mas depois vamos embora, com a virgem que não nos desampara.
— Mas, você é apenas um menino, deve ter pai e mãe?
— Sim, tive, mas não os conheci. Me criei sozinho, jogado daqui e dali, mas sempre amparado pela virgem Maria. Ela que sempre esteve ao meu lado me protegendo.
— Você tem muita fé, e isso é tão difícil…
— Quando tudo parece estar perdido é a fé que nos guia, quando sangramos e não sabemos a quem recorrer, pois a dor é horrível, a virgem vai estar lá, é só chamá-la, ela vai te socorrer, tenha fé, sempre…
Catarina estava escutando, quando sentiu novamente aquela ventania, que logo passou. Quando abriu os olhos, o menino e seu cavalo baio já não estavam mais ali. Olhou para ver se os avistava longe e nem poeira avistou. Ela resolveu voltar para a estância.
Chegando, resolveu ir na cozinha tomar um copo de água. Lá encontra Dona Francisca, cuja idade ninguém sabe ao certo. Uns dizem que já passou dos cem, mas é até difícil de acreditar, pelo vigor daquela senhora.
Catarina, como estava intrigada com o ocorrido, precisando conversar com alguém, viu na Dona Francisca, a pessoa certa, pois já havia ouvido falar de sua sabedoria.
— Oi Dona Francisca, tudo bem com a senhora?
— Tudo bem minha filha, você é que está parecendo estar com alguma coisa te perturbando.
— A senhora notou?
— A idade, minha filha, nos faz ver coisas além do que parece ser, são muitos anos que estamos rondando nesta terra.
— Bom, Dona Francisca, realmente estou precisando conversar…
E assim Catarina contou tudo o que havia ocorrido nos prados, da ventania, do menino montado no baio, do que ele falou. Dona Francisca a escutava atentamente. Quando Catarina acabou de falar, respirou fundo e olhou para Dona Francisca à procura de respostas. A princípio Dona Francisca fez silêncio, depois calmamente começou a falar:
— Você encontrou com o Negrinho do Pastoreio.
— Quem? — perguntou Catarina.
— O Negrinho do Pastoreio, e a história começou nesta estância. Aquele fazendeiro fez muita maldade com aquele negrinho, colocá-lo no formigueiro…
— Como assim, Dona Francisca, que formigueiro? — Catarina perguntou já com os olhos marejados.
Dona Francisca abraçou Catarina falando baixinho:
— Calma minha criança, vou te contar a história, como tudo aconteceu, mas se sinta privilegiada por tê-lo conhecido, ela está por aí, com certeza sentiu que você precisava dele, de alguma forma.
E assim Dona Francisca contou para Catarina a história do Negrinho do Pastoreio, que se tornou uma lenda.
Depois que Catarina soube de tudo, e como herdeira daquela estância, trocou o nome, que era Estância Cavalos Baios, para Estância Negrinho do Pastoreio.
Por Giovana Schneider | Marechal Floriano / ES